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sábado, dezembro 10, 2005

VOICES FROM THE PAST



Sábado, dia de colocar a casa em ordem. Ao mexer nos velhos discos de vinil, bateu a nostalgia dos velhos anos 80. Bons tempos aqueles. Com o assalto das lembranças de um período marcante para todos que viveram - ou sobreviveram - àquela fase de um país prá lá de complicado, onde alguns ainda estavam na ressaca da Ditadura, outros sequer tinham noção do que estava acontecendo em terras verde e amarelas, bateu uma vontade de ouvir algo daquele período. Por mil e um motivos, não foi Legião Urbana, U2, Madonna ou qualquer outra coisa pop assim que me ajudou a atravessar uma fase de problemas familiares, incertezas financeiras mil e todas as crises de adolescência. Enquanto a maioria dos amigos se entregava aos arranjos simples e grudentos da música fácil, eu me iniciava no contagiante mundo do rock pesado, onde quem gosta de música apenas por moda, está fadado à exclusão.

E um dos grupos que mais me ajudou a esquecer da irritante realidade foi o Mutilator. Estou ouvindo pela terceira vez consecutiva e revivendo os bons momentos do passado. Aproveito para incluir aqui a resenha que fiz sobre o álbum "Into The Strange" para a sessão "Classics" da revista Valhalla. Há alguns meses, soube que a Cogumelo, gravadora do, infelizmente, extinto grupo, relançou o trabalho em CD, tudo remasterizado. O redator da Valhalla me informou que o texto iria fazer parte do novo encarte, algo que me encheria de orgulho. Mais tarde, o dono da empresa, via e-mail, me confirmou o interesse, mas houve um problema qualquer e isso não mais aconteceria. De um modo ou de outro, "Into The Strange" continua me salvando, mesmo que momentaneamente, desta vidinha entediante.

Em tempo, para os que me conhecem, a coincidência dos apelidos não tem nada a ver com minhas palavras.

Mutilator - Into The Strange (1988)

O Mutilator foi mais uma das excelentes bandas mineiras responsáveis pelo desenvolvimento do metal brasileiro no final da década de 1980. "Immortal Force", disco de estréia virou um clássico, com sua temática black/death metal. Mas foi com "Into The Strange", lançado em 1988 - mesmo ano em que o Sepultura gravou "Beneath The Remains" - que Magoo (voz e guitarra), C.M. (ex-Cova, na guitarra), Armando (ex-Holocausto, na bateria) e Kleber (baixo) deram um passo à frente. As temáticas adolescentes e os arranjos toscos foram trocados por letras adultas e músicas do mais puro thrash nacional. As oito faixas transformaram aquele LP em uma peça de extrema importância para qualquer coleção de quem aprecia o metal bem feito, de bom gosto e de relevância.

Lembro da primeira vez em que ouvi o álbum, ainda com um pé atrás, pois nunca curti seu antecessor. A instrumental "Raise The Strange" já deixou no ar o sintoma da mudança. Arranjos técnicos e sem exageros com a clássica formação "dedilhado seguido de solo". Um som calmo para contrastar com a porrada thrash de "Vanishing The Haze", cadenciada, com um riff cortante e refrão forte. E os vocais eram outra surpresa agradável, pois ao invés dos urros do ex-frontman Sílvio SDN, Magoo assumiu os vocais e ele cantava, com a voz grave, é claro, mas as palavras eram compreensíveis! Se um dia fosse necessário escolher os solos mais importantes do metal no Brasil, aquele gravado nesta música não poderia faltar entre o Top 10.

Outra mudança positiva surgia em "Greetings (To The Deads)". A parte lírica agora também se destacava. E os versos do vocalista, de Armando e de C.M. prestavam uma justa homenagem para o cartunista Henfil - que morrera em janeiro daquele ano, vítima da Aids, contraída em uma transfusão de sangue - e "a todas as pessoas que receberam apoio e reconhecimento tarde demais". E que som era aquele. A típica headbanging track perfeita para ser tocada ao vivo. Quando os últimos acordes de "Lost Words" encerraram o lado A do vinil, recordo até hoje, imaginei o Mutilator tocando no exterior, nos grandes festivais, junto com Sepultura e todos os nossos outros ídolos gringos. Era qualidade demais para ficar apenas nos toca-discos dos headbangers brasileiros.

No lado B, a "bolacha" abria com a pesadíssima "Fighting The Past", cujos arranjos elaborados e variações de andamento lembravam muito o Sepultura da época, mostrando que os grupos de Minas Gerais estavam muito sintonizados naquela fase. A faixa título seguia a mesma linha, com baixo e bateria se destacando. A instrumental "Five Minutes Beyond The Walls" era um tributo à tradição do thrash da Bay Aerea, onde os integrantes do Mutilator provavam que no Brasil era possível criar material semelhante ao que estava acontecendo na cena mundial. E, por último, "A Place To Go" dava a certeza de que o Mutilator venceria no exterior e nos encheria de orgulho. Não foi isso que ocorreu. O grupo chegou até a ser citado em uma ampla reportagem da revista Veja sobre o heavy metal no país, com direito à foto e declaração do vocalista. Mas a banda acabou e, anos mais tarde, parte da letra daquela última faixa se tornou tragicamente profética: em tradução livre, "não há nada mais que eu possa fazer neste lugar estranho, entre estas pessoas prontas para atirar e nos mandar para o espaço". Impossível não lembrar que Magoo foi assassinado em 2001 na Inglaterra, quando estaria tocando com o pessoal do New Model Army. (AB)

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Hoje, um ano depois que fiz esta resenha, descobri que há uma outra versão para a morte de Alexandre Magoo. Ele teria passado depois de uma overdose. Mas isso não importa, o que interessa é que ele, junto com Eric Carr, Dimebad Darrel, Cliff Burton, faz falta.


[Ouvindo: Mutilator - Fighting The Past - Álbum/Vinil: Into The Strange]

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