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domingo, julho 24, 2005

HISTÓRIAS DO FUTEBOL



O futebol de Santa Catarina tem uma tradição quase pífia no cenário nacional. Mas sua história tem capítulos belíssimos, tanto em histórias de alegria quanto de tristeza. E a região Sul do Estado contribui consideravelmente para isto. Mais uma vez, como comprova excelente matéria do colega Gilvan França na edição deste domingo do jornal A Notícia, a cidade de Criciúma é o berço de outro destes capítulos.

A força do município no futebol não é novidade. Muito antes do Criciúma conquistar a Copa do Brasil e chegar às quartas-de-final da Libertadores da América, existiu o Metropol. Um timaço lendário que é praticamente desconhecido no restante do país, apesar de ter assustado os grandes clubes de Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul na década de 1960, como muito bem retratou o colega Zédassilva, em seu obrigatório livro "Histórias que a bola esqueceu" (no qual se comprova que o Metropol foi o primeiro clube brasileiro a realizar uma excursão na Europa). Hoje, a reportagem de Gilvan França apresenta um novo episódio - trágico, por sinal - do futebol daquele município. A morte sistemática de quase toda uma formação do extinto Próspera graças à desinformação vigente naquela época.

Eles morreram para jogar futebol

Seringas compartilhadas no vestiário contaminaram com hepatite C o Próspera de 1967
Gilvan França

Criciúma - Os craques do passado, que lotaram estádios do Sul do Estado e construíram as mais fantásticas histórias do futebol catarinense, estão morrendo driblados por uma doença silenciosa, fatal e que adquiriram na época em que empolgavam e emocionavam multidões. O uso compartilhado de seringas e agulhas, nos vestiários, para aplicação de glicose, vitaminas ou medicamentos para combater doenças específicas infectou, comprovadamente, sete de um grupo de 11 jogadores que posaram para uma foto do E.C. Próspera, em 1967, antes de um jogo contra o então todo poderoso Metropol.
O drama foi tornado público nesta semana pelo ex-goleiro do Próspera Dionísio Virtuoso, 60 anos, que há três anos descobriu que estava contaminado pelo vírus da hepatite C e já com cirrose. A partir disso, passou a fazer contatos e juntar peças em um quebra-cabeça que hoje não lhe deixa qualquer dúvida. Pessoalmente, ele visitou ex-companheiros de time e foi a enterro de diversos. "Desse time só quatro estão vivos e eu fui ao enterro de quatro e todos morreram em conseqüência da doença. Sei que mais um morreu disso e que os outros podem estar com a doença", comenta Dionísio.
O Atendimento Multidisciplinar Especializado (AME), órgão da Secretaria Municipal de Saúde de Criciúma, que faz o acompanhamento de pacientes portadores de doenças de comunicação compulsória confirma a contabilidade de Dionísio e tem entre seus pacientes outros integrantes daquele mesmo time. Os técnicos do AME também concordam que a forma de transmissão da doença foi o compartilhamento de seringas e agulhas. "Naquele tempo o enfermeiro fervia as seringas e agulhas em uma latinha e todos achávamos que estava esterilizado", lembra Virtuoso.
Jogadores e enfermeiros estavam errados, esclarece o médico Luiz Augusto Borba, da equipe do AME. "Tecnicamente, a contaminação pode e deve ter sido por esse motivo", diz o profissional. O ex-goleiro do Próspera, ao revelar o fato e expor publicamente seu caso, garante que não há qualquer interesse em acionar juridicamente o clube, "mas apenas mostrar mais um problema daqueles que fizeram a alegria de milhares de pessoas e hoje estão esquecidos".

Sofrimento da família Fraga em dose dupla

Meia-esquerda de dribles desconcertantes e autor de gols históricos, Luiz Gonzaga Fraga, 62 anos, lembra com saudades do tempo que o Próspera arrastava multidões. Sabará, como era conhecido, jogava ao lado do irmão, o lendário Neri Fraga, que morreu há cinco anos, vítima de câncer de fígado, uma das conseqüências da ação silenciosa e letal da hepatite C.
Sabará, que jogou com Dionísio Virtuoso, descobriu que estava contaminado há cerca de cinco anos. "Fui doar sangue para minha filha e no Hemosc descobriram", conta o ídolo do passado. Ele é um dos raros casos de pessoas que têm o vírus, mas não apresentam sintomas. "Na época fiquei apavorado, mas passei a me cuidar e manter controle médico e nunca tive problemas", contra Fraga.
Seu irmão, no entanto, não teve a mesma sorte, relata. "O Neri descobriu que estava com hepatite e depois com cirrose, mas nunca se cuidou. Dizia que ia morrer de qualquer jeito e como gostava, não deixava de tomar uma cervejinha. Eu felizmente nunca fui muito chegado a bebida", relata o meia esquerda.

Há quatro anos Rubão convive com o drama

Aos 65 anos, Rubens Ignácia Vicência, é segurança em uma estatal catarinense, mas entre 1954 e 1977, foi um dos goleiros mais conhecidos do Estado e do país. Ele jogou no Metropol, no Avaí e no Marcílio Dias em Santa Catarina e era chamado de Rubão. Jogou ainda no Atlético Paranaense e no Grêmio de Porto Alegre e se orgulha de ter tido uma carreira longa, ao contrário da maioria. "Foram 23 anos dedicados ao futebol", contabiliza. Mas, nunca jogou no Próspera, o que comprova que a contaminação da hepatite não era exclusividade do "Time da Raça", como ficou imortalizado o time do bairro Próspera, em Criciúma.
Rubão descobriu há quatro anos que tinha o vírus e vem tratando com o médico Luiz Augusto Borba. "Está tudo controlado, tenho uma vida normal, tomando medicamentos e fazendo minhas orações", diz o ex-goleiro. Ele garante que conhece "vários companheiros" que têm a doença, "inclusive em Florianópolis". Rubão está entre os pacientes que aguardam liberação de medicamentos pelo governo do Estado. A burocracia é grande e justifica o tamanho da fila. Os dois anti-virais empregados no tratamento que dura de seis meses a um ano custam R$ 3 mil, por mês.

Casos semelhantes em mais clubes do Sul do Estado

Os casos de contaminação pelo compartilhamento de seringas e agulhas em clubes de futebol não é uma situação exclusiva do E.C. Próspera, segundo garante o médico Luiz Augusto Borba, que há cerca de 20 anos atua na área de hepatologia em Criciúma. "Tenho entre meus pacientes ex-jogadores do Atlético Operário, Comerciário, Próspera, Metropol, Ferroviário de Tubarão e até do Criciúma", afirma Borba, explicando que os cuidados em relação ao vírus da hepatite C começaram a ser tomados no início dos anos 90.
Com base as informações que possui, Borba concorda que muitos ex-atletas de futebol, que encerraram suas carreiras nos anos 70 e 80 podem estar contaminados e não sabem, já que a hepatite C leva anos para se manifestar e sua acão é assintomática. O raciocínio é lógico: atletas infectados no final dos anos 60, como Dionísio e Sabará, por exemplo, constaram nos últimos cinco anos a doença e os que adquiriram a doença nos anos 80, somente poderão ter sintomas nos próximos anos, principalmente se tiverem uma vida regrada. O contrário, sem reservas alimentares e principalmente uso acentuado do álcool aceleram o processo. "O álcool potencializa o vírus", ensina Borba.

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